domingo, 9 de abril de 2023

Os filmes que nunca foram vistos

O tempo era bom, os sorrisos eram singelos e distribuídos na medida que cada um precisava. 

Massa com molho de soja e camarão, acho que foi esse o primeiro menu. O sofá era o melhor lugar da casa, aconchegante e cheio de almofadas fofinhas. Ah, e tinha também um cobertor bem quentinho cinco estrelas. Era ali que os dois viajavam e despejavam um sobre o outro os desejos e sonhos do coração. A sintonia era incrível e quase todos os sonhos eram incomuns. O coração de Théo ficava quentinho de tanto amor.





EM CONSTRUÇÃO...

quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

Em busca do amor perfeito (Parte 2)

Na foto do perfil ele usava uma camisa branca por baixo e um suéter preto. Estava em uma mesa de restaurante que tinha uma boa aparência. Miguel era educado e a conversa também era sempre maravilhosa. Dizia gostar de arte, de almoços com os pais e compras com os primos. Era canceriano. Fazia aniversário um dia antes que a Théo.

A conversa fluía como águas correntes. Falavam sobre perfumes - tinham os mesmos gostos e gostavam dos mesmos países. Ele dizia falar 5 línguas, enquanto Théo apenas o Português e “malé mal”. Alguns restaurantes em comum e um dilema - ele não gostava muito de dançar, mas mesmo assim plim plim, os olhinhos dela piscavam forte a cada mensagem recebida durante seus dias de amor virtual.

Miguel parecia perfeito, mas dizia não usar o whatsapp. Hoje em dia quem é que não fala no whatsapp? Para ele era importante preservar sua descrição, diante disso, convidou Théo para um café. Imediatamente veio um estalo à sua mente e ela se lembrou do “Edu Guedes” – o fake das Bahamas -  e disse em pensamento: “E se ele não for o cara da foto? E na verdade, for calvo, bem mais velho de que 47 anos com cara de avô?”

Já imagino a cena na minha cabeça: Théo, toda elegante, de botas pretas altas até o joelho, meias calças/colant preto, uma bermuda preta e uma blusa de linha azul – aquelas bem quentinhas e elegantes, por baixo de um casaco preto que vai até o joelho também, chegando no café vazio com uma única mesa ocupada. Nela, um senhor de óculos espelhados – isso é apavorantemente brega, sem cabelos na cabeça, com os olhos fixados na tela do celular enquanto tomava seu “abatanado” (um tipo de café cheio e mais fraco). Ela entrava, olhava para todos os lados, avistava o único senhor no recinto e saia disfarçadamente desesperada como se tivesse errado de endereço. Risos

Depois do convite para o café, Théo imediatamente mudou de assunto. Ela não estava preparada para um encontro com qualquer pessoa que fosse. A ideia era encontrar alguém no aplicativo, mas ela não pensou na fase de que teria que se encontrar com essas pessoas para conhecer o tão esperado match perfeito.

Theodora insistiu no app de mensagens instantâneas mais usado no mundo. Jogou o seu número na conversa com Miguel e saiu do aplicativo de relacionamentos na esperança que ele falasse com ela no Whatsapp. Afinal, ela precisava saber se ele era de verdade.

Se passaram dois dias e nada do bonito aparecer. Théo resolveu voltar para o aplicativo pra ver tinha alguma mensagem. Enquanto isso, o App continuava a ofertar novos perfis. As fotos iam de um extremo ao outro de impacto. Alguns homens posavam dentro de carros com símbolos fortes no volante, alguns sem roupa, em praias, com cachorros, em festas com a bio “Carpe Diem”, outros não mostravam rostos. Milhares na academia que em Portugal chamam de Ginásio.

Tinha esses e tinha o Joaquim que descrevia na sua bio que era um gajo simples, divertido, gordinho, amigo do seu amigo e “acima de tudo solteiro e bom rapaz”. Ser solteiro nesse país e estar nos aplicativos de relacionamento não deve ser algo comum (risos). Parecia um bom rapaz, mas o dedo da Théo foi para a esquerda. É aquele negócio, quando é sincero demais tem que se desconfiar também.

Chegando nas conversas antigas, elas já não estavam mais lá. Nenhuma. Depois que Théo saiu e voltou ao aplicativo, todas as conversas sumiram, todas!! E agora, como encontrar Miguel? A partir daí, Théo foi a loucura a procura do bonito. Passou o dedo para a esquerda desesperadamente tentando reencontrá-lo. Tão desesperadamente que o aplicativo pensou que ela fosse um robô e solicitou uma selfie para confirmar sua identidade.

Lascou! A conta ficou em análise por um dia. Em foi banida, não se conseguia mais entrar ali. E o Miguel sumiu para sempre ou não? Théo teve a brilhante ideia de criar uma conta em um outro aplicativo, semelhante ao primeiro, mas lá quem dá o primeiro passo depois do match é a mulher. A conversa só começa se ela quiser. E começou tudo outra vez. Algumas carinhas conhecidas que apareciam no aplicativo anterior. Era divertido, muito divertido ler as biografias dos perfis.

Enquanto ela não encontrava o Miguel, porque não conhecer outras pessoas? Entre as idas e vindas dos dedinhos um match chamou a atenção da Théo. Nuno. Médico, 2 filhos, um cão. Morava perto dela e era um pai solteiro. Ele tinha o cabelo jogadinho para o lado. Barba serrada e parecia inteligente. Apesar de ter o estilo dela, a conversa foi pouca, ele nem deu moral pra ela. Médicos...

Nyló era músico. Tocava Violoncelo na Áustria. Só falava inglês e a Théo coitada, sofreu no google tradutor. Ele dizia não usar redes sociais, nem whatsapp: “I even don’t use smartphone, i use just laptop, I have no facebook, just Telegram on the laptop. I have phone – Nokia”. Ela claro, correu dele. Isso é problema e dos grandes. Alguém que não tem redes sociais hoje em dia tem algo pra esconder. É fato!

Dali em diante as perguntas continuavam as mesmas, as conversas sem graça, ninguém tão interessante como o Miguel apareceu, nem muito menos ele. Talvez porque ele não era o cara da foto e se passava pelo cara simpático da foto. Talvez por isso nunca mandou uma mensagem no whatsapp e sumiu do aplicativo. Deve ter mudado o nome ou colocado sua foto real.

Era fim de expediente de uma sexta-feira e Theodora desistiu mais uma vez de encontrar o amor por trás das telas. Ela resolveu comemorar o tempo perdido com alguns bons drinks e muitas risadas ao lado da melhor amiga, a Paula. Na mesa ao lado, um olhar bem forte e marcante fez com que estremeceu Théo. Era Miguel, bem ali do lado dela, em carne e osso. Ele a reconheceu e levantou o seu drink em direção a ela mencionando um brinde. Théo devolveu a menção com os olhos fitando os dele. Seus olhos brilhavam e os seus lábios tremiam. A música era bem calma e no fim das contas ela percebeu que o mundo real é bem mais gostoso, divertido que o virtual. Cheers!

segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

Em busca do amor perfeito (Parte 1)

 Só mais um sábado ensolarado e frio, mas não para Theodora, que depois de uma noite agitada no bar de sempre (aquele da praia perto de sua casa, com a vista linda), com as amigas a beber, acordou decidida a abrir uma conta em um aplicativo de relacionamentos pra ver se a vida amorosa decola, depois da terrível história que vocês já conhecem bem.

A primeira vez que Theodora entrou em um aplicativo foi nas suas férias para Portugal. Ficou um dia e não aguentou ler as mesmas perguntas inúmeras vezes: “O que faz em Portugal?”, “Trabalha com o que?”, “Por que Portugal?”. Os questionamentos soavam um pouco preconceituosos, vocês devem saber que, infelizmente, a mulher brasileira é muito descriminada por lá. Mais uma vez, as mulheres, no geral, se ferram por algo que umas e outras fizeram que não é legal. 

Na verdade, isso também, de alguma maneira, é preconceito, pois se umas e outras fizeram qualquer coisa que não agradou a sociedade portuguesa, elas fizeram porque queriam e sabiam o que estavam fazendo. Então, quem é a Theodora ou qualquer outra pessoa para julgar o que alguém fez e que não é absolutamente da sua conta?  

Lá seguiu a bonita, dondoca nos deslizes para a esquerda e direita da tela do seu celular. Os deslizes para a direita significavam um gosto pelo cara do outro lado da tela. Já para a esquerda representavam que não tinham nada do que ela gostava. Pra encantar a Theodora não é muito difícil, ou talvez seja. Vocês é que vão dizer. Uma barba serrada, um cabelinho um pouco maior do que o conceitual e jogadinho de lado já a deixam pensativa. Ganha mais um ponto o homem que tem os dentes bonitos, para os que têm dentes feios o dedo dela já desliza para a esquerda imediatamente. Nada de match (esse é o nome dado para quando os gostos dela e do bonito do outro lado da tela se cruzam). Coisa da Geração Millennials (pessoas que nasceram entre 1980 e 1995).

As biografias eram o que mais intrigava a Theodora. Alguns diziam que só queriam ser felizes, que queriam coisas momentâneas. Outros que procuravam o par perfeito, para dividir a vida e até os filhos que já tinham, coisa que Theo não se importava de jeito nenhum, não é segredo que ela é apaixonada por crianças! Tinha também os desesperados que diziam ter todos os dentes (em Portugal é assustador o número de pessoas sem dentes), que os banhos eram frequentes, existe também essa cultura de que o Português não é muito adepto ao banho, mas é algo que não condiz com a realidade e, acredite, algumas pessoas ainda brincam com isso.

Tinham alguns perfis de casais à procura de parceiras para apimentarem a relação e outros perfis de homens casados à procura de uma mulher que fizesse o que a sua esposa não fazia. “Esse mundo está mesmo perdido, as pessoas perderam a noção do valor e da família”, esbaforava Théo, em frente ao celular.

O primeiro Match veio. Era o João. Um português de 1. 72 de altura – assim ele dizia na sua biografia/bio. Ele gostava de cachorros, tinha um labrador com o nome de Mike. Tinha uma conversa agradável, mas morava muito longe de Théo e relacionamentos à distância não fazia a cabeça da querida Theodora. Viraram amigos virtuais e se segue no instaram até hoje. Cada passeio que o João faz com o Mike é uma foto nova para o instagram. Cachorros chamam mesmo a atenção, não tem jeito.

No meio desses amores de aplicativo, existem muitos perfis fakes. O que tem pra todo lado dentro da internet, mas um foi além do imaginável e colocou uma foto do Edu Guedes – um apresentador brasileiro super simpático. Por curiosidade, Théo deslizou o dedo para a direita pra ver até onde o “Edu” iria e, pasmem, ele tentou ser o cara perfeito -provavelmente aos olhos dele. Disse que morava nas Bahamas. Trabalhava para um banco e adorava vier na praia (a localização dele, mostrada por quilômetros, não dava nas Bahamas), mas que na semana seguinte estaria em Portugal pois tinha recebido uma proposta de um banco português.

Theodora entrou na brincadeira e fingiu acreditar. Disse a ele que era hora de ganhar muito mais em Portugal, lembrando que o salário do país de Dom Pedro I é o menor da Europa e que toda gente sabe disso, só o Edu que não deve saber. Ele ainda disse ter dois filhos gêmeos que viviam com a mãe em Bruxelas. E que durante a estadia em Portugal se hospedaria em um hotel da Avenida Liberdade – onde estão localizados os hotéis e restaurantes mais caros de Lisboa. Era tanto blá, blá, blá que a pequena Théo cansou e denunciou a conta que tinha o símbolo de verificada. Não se sabe como ele conseguiu provar que a foto do Edu Guedes era dele, mas... viva as brechas do mundo virtual.

A bio da Theodora dizia em “alto e bom tom”: me assusto com pessoas com dentes mal cuidados ou sem eles. A partir daí, Théo colecionou alguns novos amigos virtuais e boas risadas. Todos eles diziam ter dentes. No meio dos novos amigos, surgiu o Miguel, 47 anos, 1,83 de altura. Muito discreto e de uma conversa ímpar. Parecia um homem íntegro, à procura do mesmo que Théo. Alguém inteligente, sincero e simpático.


*Os nomes foram trocadas e as histórias nem sempre são reais