Só mais um sábado ensolarado e frio, mas não para Theodora, que depois de uma noite agitada no bar de sempre (aquele da praia perto de sua casa, com a vista linda), com as amigas a beber, acordou decidida a abrir uma conta em um aplicativo de relacionamentos pra ver se a vida amorosa decola, depois da terrível história que vocês já conhecem bem.
A primeira vez que Theodora entrou em um aplicativo foi nas suas férias para Portugal. Ficou um dia e não aguentou ler as mesmas perguntas inúmeras vezes: “O que faz em Portugal?”, “Trabalha com o que?”, “Por que Portugal?”. Os questionamentos soavam um pouco preconceituosos, vocês devem saber que, infelizmente, a mulher brasileira é muito descriminada por lá. Mais uma vez, as mulheres, no geral, se ferram por algo que umas e outras fizeram que não é legal.
Na verdade, isso também, de alguma maneira, é preconceito, pois se umas e outras fizeram qualquer coisa que não agradou a sociedade portuguesa, elas fizeram porque queriam e sabiam o que estavam fazendo. Então, quem é a Theodora ou qualquer outra pessoa para julgar o que alguém fez e que não é absolutamente da sua conta?
Lá seguiu a bonita, dondoca nos deslizes para a esquerda e direita da tela do seu celular. Os deslizes para a direita significavam um gosto pelo cara do outro lado da tela. Já para a esquerda representavam que não tinham nada do que ela gostava. Pra encantar a Theodora não é muito difícil, ou talvez seja. Vocês é que vão dizer. Uma barba serrada, um cabelinho um pouco maior do que o conceitual e jogadinho de lado já a deixam pensativa. Ganha mais um ponto o homem que tem os dentes bonitos, para os que têm dentes feios o dedo dela já desliza para a esquerda imediatamente. Nada de match (esse é o nome dado para quando os gostos dela e do bonito do outro lado da tela se cruzam). Coisa da Geração Millennials (pessoas que nasceram entre 1980 e 1995).
As biografias eram o que mais intrigava a Theodora. Alguns diziam que só queriam ser felizes, que queriam coisas momentâneas. Outros que procuravam o par perfeito, para dividir a vida e até os filhos que já tinham, coisa que Theo não se importava de jeito nenhum, não é segredo que ela é apaixonada por crianças! Tinha também os desesperados que diziam ter todos os dentes (em Portugal é assustador o número de pessoas sem dentes), que os banhos eram frequentes, existe também essa cultura de que o Português não é muito adepto ao banho, mas é algo que não condiz com a realidade e, acredite, algumas pessoas ainda brincam com isso.
Tinham alguns perfis de casais à procura de parceiras para apimentarem a relação e outros perfis de homens casados à procura de uma mulher que fizesse o que a sua esposa não fazia. “Esse mundo está mesmo perdido, as pessoas perderam a noção do valor e da família”, esbaforava Théo, em frente ao celular.
O primeiro Match veio. Era o João. Um português de 1. 72 de altura – assim ele dizia na sua biografia/bio. Ele gostava de cachorros, tinha um labrador com o nome de Mike. Tinha uma conversa agradável, mas morava muito longe de Théo e relacionamentos à distância não fazia a cabeça da querida Theodora. Viraram amigos virtuais e se segue no instaram até hoje. Cada passeio que o João faz com o Mike é uma foto nova para o instagram. Cachorros chamam mesmo a atenção, não tem jeito.
No meio desses amores de aplicativo, existem muitos perfis fakes. O que tem pra todo lado dentro da internet, mas um foi além do imaginável e colocou uma foto do Edu Guedes – um apresentador brasileiro super simpático. Por curiosidade, Théo deslizou o dedo para a direita pra ver até onde o “Edu” iria e, pasmem, ele tentou ser o cara perfeito -provavelmente aos olhos dele. Disse que morava nas Bahamas. Trabalhava para um banco e adorava vier na praia (a localização dele, mostrada por quilômetros, não dava nas Bahamas), mas que na semana seguinte estaria em Portugal pois tinha recebido uma proposta de um banco português.
Theodora entrou na brincadeira e fingiu acreditar. Disse a ele que era hora de ganhar muito mais em Portugal, lembrando que o salário do país de Dom Pedro I é o menor da Europa e que toda gente sabe disso, só o Edu que não deve saber. Ele ainda disse ter dois filhos gêmeos que viviam com a mãe em Bruxelas. E que durante a estadia em Portugal se hospedaria em um hotel da Avenida Liberdade – onde estão localizados os hotéis e restaurantes mais caros de Lisboa. Era tanto blá, blá, blá que a pequena Théo cansou e denunciou a conta que tinha o símbolo de verificada. Não se sabe como ele conseguiu provar que a foto do Edu Guedes era dele, mas... viva as brechas do mundo virtual.
A bio da Theodora dizia em “alto e bom tom”: me assusto com pessoas com dentes mal cuidados ou sem eles. A partir daí, Théo colecionou alguns novos amigos virtuais e boas risadas. Todos eles diziam ter dentes. No meio dos novos amigos, surgiu o Miguel, 47 anos, 1,83 de altura. Muito discreto e de uma conversa ímpar. Parecia um homem íntegro, à procura do mesmo que Théo. Alguém inteligente, sincero e simpático.
*Os nomes foram trocadas e as histórias nem sempre são reais
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